A água parada, traiçoeira e farta, era como um aviso de perigo iminente. A temperatura indicava grande profundidade e, assim, a vasta quantidade de espécies que chamavam O Lago de lar. Para os leigos era um dos únicos pontos atraentes da cidade que, em si, não guardava nenhum charme. O próprio ar a se respirar, parecia rarefeito. A beleza contida naquele ponto específico era o que tornava-o tão perigoso; as árvores frutíferas a adornar às margens guardavam um terrível segredo. Qualquer um que ousasse tocar em uma das vistosas frutas teria de arcar com as severas conseqüências; o que antes era belo e convidativo revelava sua verdadeira face: o gramado verdejante tornava-se lama e, as árvores, secas. O lago cuja superfície era espelhada cobria-se de uma bruma densa a confundir o intruso, e o pequeno bosque que o antecedia vestia-se de pântano. Um feitiço lançado há gerações para manter o local protegido. Apesar disso, os “residentes” estavam acostumados o suficiente com a hostilidade da pequena cidade, para acreditar que o lago fosse inofensivo. Reuniam-se ali eventualmente, sem jamais tocar em qualquer fruto. À noite era praticamente impossível guiar-se pelas trilhas e as pedras nodosas - fosse pela constante neblina, ou pelo medo imposto pelos espíritos atormentados que vagavam sem rumo, condenados a não encontrar descanso. Ali os ciclos das estações pareciam agir naturalmente, como também as faces da lua; em seu pleno poder, a cheia refletia na inércia da água e mostrava os horrores da madrugada: espectros pairavam tanto sobre a superfície, quanto sobre a copa das árvores. Bastava relar nas margens para que os seres atacassem e punissem quem quer que fosse, arrastando-o para o fundo e o fim.